sábado, 19 de novembro de 2011

Para ponto passa


Eu parada. No ponto. O ônibus não passa, só os carros passam. Passam e passam e passam. A fachada do prédio é limpa, está sendo limpa, está ficando limpa. Os carros passam. A fachada é limpa. E eu parada. Um ruído. Um carro passa. O carro que passa faz um ruído. O ruído é um barulho. O barulho para. Não para o barulho. O barulho faz parar. Parar os carros que passam e a fachada que é limpa. Eu parada. Já era assim, já era parada, já estava parada. Eu parada. Os carros passam. A fachada é limpa. O barulho para. Para o barulho. Eu parada. O ônibus passa.

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Note que; é desinteressante


Eu queria transformar em palavras e te contar. Seria bom se você soubesse. Seria melhor, mas não pra nós. Isso tem me consumido, me matado aos poucos, e não conheço morte sentimental pior do que essa. Olhar pros lados, seguir em frente ou mesmo voltar atrás; eu enlouqueço, giro e caio chorando na cama. Isso, que muitos chamam de ciúme, eu prefiro não dar nome. Pra mim é coisa de maluco.

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

Pura e simplesmente, na forma mais confusa


- Invejo seu coração.
- Ele bate por você – pensei. Devo ter corado. Por alguma razão senti vergonha de mim. Por que não dizer? Só pensar, sempre, mas que mania essa a minha. Censuro-me. Pare com isso, era só um desenho, não tem importância. Fria novamente? Você não pensou no desenho, admita, não precisa guardar tudo para si. Cansei, não quero pensar. Dane-se, agora já foi, quem sabe de uma próxima vez eu não sou mais valente? Só preciso de um abraço, do abraço. Será que isso você é capaz de fazer, menina orgulhosa?

quarta-feira, 5 de outubro de 2011

Tem valores que não mudam

Acordava cedo, em um quarto pequeno de apartamento, no meio da cidade grande. Comia fatias de pão integral com queijo minas, porque tinha que cuidar a alimentação. O achocolatado era light pra ajudar na perda de peso. Esperava a avó chegar, e iam de mãos dadas percorrendo as ruas cinzentas e mal cheirosas do bairro.
Entravam no clube e paqueravam os doces e crepes da feirinha. Não podiam, ambas, comer nada daquilo. Seguiam para o ginásio, preferiam as escadas ao elevador, e entravam na quadra. A professora e as colegas já estavam a postos, se alongando, umas ainda por chegar. Calçava a sapatilha, o que por sinal detestava, e se juntava às outras no chão empoeirado. Com o passar do tempo as músicas começavam a tocar e a coreografia deveria estar na ponta da língua, ou no corpo todo, como preferir. Fitas, bolas e arcos, certo contorcionismo e elasticidade, rostos concentrados, movimentos que tentavam se ritmar e o orgulho de quem assistia suas pequenas dançarinas tomavam conta do espaço escuro. Ao final de uma hora, as câimbras começavam e as sapatilhas surradas ficavam de lado, finalmente.
Já estava em tempo de voltar para casa, mas não sem antes seguir as ordens da nutricionista e tomar um iogurte de fruta já envelhecido da geladeira de casa. Mais uma vez os doces eram uma tentação, mas a barriga maior do que devia, acentuada pelo collant vermelho do clube, não a deixava esquecer as restrições.
O choro nunca veio e a aparência nunca foi um problema, muito menos um propósito. E assim a menina gordinha cresceu, vendo suas amigas desaparecerem debaixo de maquiagem, enfiadas dentro da academia. Isso também nunca foi um problema. Cada um esconde o que quer, mas essa menina sabe quem é amiga de verdade.

quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Estou a caminho


Só uma Kombi azul, meio velha com rasgos nos bancos, crianças pedindo doce no dia de Cosme e Damião, comprando doces dos vendedores ambulantes, achando atalhos nos postos de gasolina, comprando figurinhas na banca de jornal, tentando se ocupar no trânsito da cidade grande. Cachorro quente ou pipoca com Fondor; podia ser qual fosse a surpresa de sexta-feira, seria sempre suficiente pra deixar todo mundo sorrindo. “Penna, você leva os gêmeos ou prefere que a gente espere a Dedé?”
Bel, Ly e Gabriel, eu não esqueci vocês.

sábado, 17 de setembro de 2011

Isso tem que mudar


Ele bêbado, fedendo a cigarro. Ela lá dentro, pisando na lama. Eles na rua, reclamando, querendo entrar. Elas ouvindo música, ligando, chamando os amigos. E eu, no meio, pirando; uma vontade imensa de chorar, me esconder debaixo dos cobertores, no meio do abraço dos pais.
Mas se desesperar não adianta, não resolve os problemas. Não sei mais o que fazer. Nem as palavras conseguem mais me ajudar.

terça-feira, 13 de setembro de 2011

Coordenadora, papai, mamãe


Juro que tentei.
Juro que me esforcei.
Eu não consegui.
Geometria da molécula, hialuronidase, eutanásia, bomba de Na e K, par de elétrons não ligantes, Conferência de Berlim. Escutei, mas não entendi. As anotações no quadro, o rosto dos professores, tudo eu tentava ver, nada eu conseguia compreender.
Não foi falta de vontade. É tudo culpa da conjuntivite.