Acordava cedo, em um quarto
pequeno de apartamento, no meio da cidade grande. Comia fatias de pão integral
com queijo minas, porque tinha que cuidar a alimentação. O achocolatado era light pra ajudar na perda de peso.
Esperava a avó chegar, e iam de mãos dadas percorrendo as ruas cinzentas e mal
cheirosas do bairro.
Entravam no clube e paqueravam os
doces e crepes da feirinha. Não podiam, ambas, comer nada daquilo. Seguiam para
o ginásio, preferiam as escadas ao elevador, e entravam na quadra. A professora
e as colegas já estavam a postos, se alongando, umas ainda por chegar. Calçava
a sapatilha, o que por sinal detestava, e se juntava às outras no chão
empoeirado. Com o passar do tempo as músicas começavam a tocar e a coreografia
deveria estar na ponta da língua, ou no corpo todo, como preferir. Fitas, bolas
e arcos, certo contorcionismo e elasticidade, rostos concentrados, movimentos
que tentavam se ritmar e o orgulho de quem assistia suas pequenas dançarinas
tomavam conta do espaço escuro. Ao final de uma hora, as câimbras começavam e
as sapatilhas surradas ficavam de lado, finalmente.
Já estava em tempo de voltar para
casa, mas não sem antes seguir as ordens da nutricionista e tomar um iogurte de
fruta já envelhecido da geladeira de casa. Mais uma vez os doces eram uma
tentação, mas a barriga maior do que devia, acentuada pelo collant vermelho do
clube, não a deixava esquecer as restrições.
O choro nunca veio e a aparência
nunca foi um problema, muito menos um propósito. E assim a menina gordinha
cresceu, vendo suas amigas desaparecerem debaixo de maquiagem, enfiadas dentro
da academia. Isso também nunca foi um problema. Cada um esconde o que quer, mas
essa menina sabe quem é amiga de verdade.
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